sábado, 11 de maio de 2013

De Você Só Me restaram Boas lembranças



Todas as sextas feiras, Gilberto ia em rumo a um bar bem próximo de seu trabalho para relaxar sua cabeça e bater um bom papo com os seus amigos. Estava se recuperando de um relacionamento passageiro que teve com uma garota que só o iludiu. Prometia a si mesmo não se apaixonar mais por mulheres que adoravam lhe ver se humilhar por elas. Estava disposto a ser rude com essas. Entre um gole de cerveja e uma olhada para o ambiente, Gilberto viu uma linda moça de cabelos encaracolados, saia cinza e usando óculos escuros. Pelo o garçom, Gilberto enviou um recado dizendo se podia sentar-se junto dela. A moça respondeu negativamente para o rapaz que abaixou a cabeça com vergonha e tomou vários copos de cerveja rapidamente. Quinze minutos depois, Gilberto foi até a mesa da moça e pediu a ela delicadamente para que se sentasse e tomassem um drink juntos. A moça enfim assentiu com o pedido do rapaz e naturalmente os dois conversaram como se fossem velhos conhecidos.

- Posso ver seus olhos? – Disse ele.

- É melhor não. – Respondeu ela.

- Tudo bem. Você está com algum problema?

- Estou não. – Respondeu ela.

Ficaram alguns minutos sem se falarem nada. De repente a moça começou a soluçar e Gilberto percebeu que ela estava chorando.

- Você está bem? Quer que eu o leve para a sua casa? – Perguntou Gilberto.

- Não, está tudo bem. Você quer que eu tire os óculos? – Perguntou ela.

- Não se você não quiser.

- Tudo bem. Vou tirar eles. – Disse ela.

Quando a moça tirou os óculos, Gilberto viu em seus olhos um grande inchaço.

- Mas o quê foi isso? – Perguntou Gilberto indignado.

- Caí da escada. Nada demais.

- Isso não parece com queda, Eliza. Está nítido que você sofreu uma agressão.

A moça não conseguiu mais mentir. Contou a verdade para Gilberto. Estava sendo agredida fisicamente e verbalmente por seu marido. “Todos os dias ele me bate”, disse ela. “Prometeu até me matar”.

- Devemos ir até a policia para dar parte deste infeliz. – Disse Gilberto absorto.

- Não devemos. Será pior. Eu já tentei, mas ele quase me enforca neste dia.

- Você não pode continuar ficando assim, a mercê deste maldito.

- Por favor, não se meta. Infelizmente alguns casais passam por desentendimentos, e em alguns casos por agressões. Preciso ir para casa. Adeus!

Eliza retirou-se do bar aos prantos. Gilberto ficou abalado e comovido pela moça. “Não deveria ter lhe pedido para que tirasse os óculos”, disse Gilberto. “Não. Acho que fiz o certo. Agora conheço o seu problema”.

Gilberto pensou em Eliza a semana inteira. Cogitou várias vezes em ir até a delegacia e denunciar o marido da moça. Porém não tinha referências para chegar até ele, e além do mais não poderia se intrometer na vida da moça que conheceu e se falou por umas duas horas apenas. Esqueceu a ideia de denuncia-lo, porém não conseguiu se esquecer de Eliza.

Duas semanas mais tarde, Gilberto encontrou a moça novamente no mesmo bar e na mesma mesa. Ela estava linda com um vestido azul. Gilberto aproximou-se dela e pôde contemplar os lindos olhos castanhos da moça. Novamente conversaram por horas e Gilberto percebeu que ela estava mais feliz do que a noite passada. Só depois que Gilberto passou suas mãos no pescoço de Eliza, foi que ele pôde notar que ela sentia uma dor recôndita.

- Sentes dor? – Perguntou Gilberto.

- É apenas um torcicolo. – Respondeu ela.

- Hum, Sei.

Eliza evitava falar sobre o seu relacionamento e Gilberto, após descobrir a dor da moça, ficou agitado e preocupado com ela. O clima entre os dois ficou frio, e Eliza despediu-se de Gilberto. Na semana seguinte, Gilberto não viu a moça sentada no bar. Ficou até uma hora da manhã lhe esperando, porém em debalde. Alguma coisa dizia a ele que ele nunca mais a veria. Ficou triste e desanimado.
Na outra semana, Gilberto entrou no bar e se deparou com Eliza, tão linda como ele a viu pela a primeira vez. O sorriso dela lhe trouxe alívio, e Gilberto aproximou-se dela com uma alegria que ninguém poderia decifrar.

- Como você está bem, Eliza! – Disse ele. – Seu semblante está ótimo.

- Separei-me de meu marido. Irei me divorciar. Ele não aceitou no começo, mas logo viu que seria o melhor para a gente. Estou de certa forma muito infeliz. Um pouco desapontada com ele, claro. Pensei que ele fosse outra pessoa. Infelizmente ele não continuou o mesmo comigo. Mudou muito depois que nos casamos.

- Fico feliz por você. Você merece um verdadeiro amor. Alguém que nunca mude. Alguém que seja a mesma pessoa até o fim de sua vida. Que lhe acolha nos momentos mais difíceis. Alguém que lhe carregue nos braços quando os seus passos fraquejar.

- Eu só não o denunciei porque pensei que ele iria mudar. Dei várias chances para ele. Meu amor foi paciente, porém ele fraquejou quando chegou ao seu limite.

- Estou muito feliz por você, Eliza. – Disse Gilberto sentindo algo muito forte. – Espero que você seja muito feliz. Ainda te encontro por aqui?

- oh, sim. Podemos nos falar amanhã? Também quero muito falar com você. – Disse ela.

- Podemos sim, Eliza. Também quero muito falar com você. – Ao dizer isso, Gilberto percebeu que ela escrevia alguma coisa debaixo da mesa.

- O quê você está escrevendo aí? – Perguntou Gilberto curiosamente.

- Amanhã saberás. Promete não ler até amanhã? – Propôs ela.

- Sim. Amanhã lerei. Paciência é umas de minhas virtudes. – Respondeu Gilberto.

No dia seguinte, às 21:30, Gilberto sentou-se no mesmo lugar em que eles se conheceram. Lá, ele ficou esperando por Eliza. Estava muito agitado em ler o que estava escrito debaixo da mesa, porém não queria quebrar a promessa que fez com ela. Isso seria um mau começo.

De repente Gilberto ouviu uma noticia que vinha da televisão do bar.

“Jovem é assassinada a facadas em uma loja de roupas. O principal suspeito de tê-la matado é o seu próprio marido que não aceitava o término do casamento deles.”

- Que coisa! – Disse o proprietário do bar. – Essas notícias trágicas estão ficando rotineiras.

Gilberto via a notícia com o coração abalado. “Não pode ser Eliza. Seu marido havia aceitado”.

A notícia seguia e quando o jornal expôs a foto da moça, Gilberto entortou os lábios e chorou muito por dentro. Não conseguia controla-lo.

- Mas essa moça já veio aqui no bar. – Disse o proprietário.

- Sim, já veio. – Disse Gilberto com as mãos em sua testa. – Já veio sim.

Gilberto enfim lembrou-se da escrita na mesa.

Quando Gilberto abaixou-se para ler o que estava escrito por Eliza, leu a seguinte mensagem:

“Estou perdidamente apaixonada por você. Espero que você nunca me decepcione, meu amor”

- Eu jamais te decepcionaria, meu amor. Jamais.


Por Patrick Santos

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